Eu leio uma espécie de "Maria" sobre pessoas inteligentes.
O meu telemóvel trazia um manual de instruções. O meu computador trazia um manual de instruções. O meu afinador de guitarra trazia um manual de instruções. A minha calculadora trazia um manual de instruções.
Sabem quantas frases li em cada um destes manuais?
Nenhuma.
Não quero com isto dizer que sou um ser extraordinariamente inteligente e com uma capacidade fora do normal para aprender sozinho a trabalhar com os mais variados utensílios. Até porque se for essa a explicação para o facto de eu não pegar nos manuais de instruções, então todos nós, portugueses, somos extraordinariamente inteligentes e temos uma capacidade fora do normal para aprender sozinhos a trabalhar com os mais variados utensílios.
Porque todos (mas mesmo todos) nós ignoramos o manual de instruções.
E só pegamos nele quando pensamos algo semelhante a:
“Epá, acho que isto não era para retirar do resto do aparelho… Parece-me que já parti alguma coisa. Deixa lá ver o manual…”
O que me leva a concluir uma coisa: nós não gostamos de ler sobre algo com o qual convivemos no dia-a-dia.
Eu acho isto lógico, mas ainda assim vou tentar ser mais claro.
Reparem: Eu preciso de calculadora quase todos os dias. Assim sendo, quando a comprei, atirei-me logo a ela, ignorado o que sobre ela se escreve no manual de instruções.
Do mesmo modo, Mário Soares também não deverá de gostar de ler sobre a sesta…
E o raciocínio é linear: se temos de conviver com algo no dia-a-dia, no tempo livre que nos resta o que sabe bem é ler sobre algo ao qual não estamos expostos no horário de trabalho. Aliás, só isso explica o facto de o estimado leitor estar a visualizar isto agora. Aposto que no seu trabalho não há textos enfadonhos e parvos… A não ser, claro, que trabalhe com os discursos de Luis Filipe Menezes.
(Vamos partir do princípio que ninguém me lê durante o horário de trabalho. Há tempos o sitemeter havia registado uma entrada neste blog às 12:23 de uma quarta-feira e o IP era do Banco de Portugal… Suponhamos então que no Banco de Portugal não se trabalha às 12:23, está bem?)
Digam-me, caros leitores: não acham isto lógico?
Bom, até este ponto, encontro-me apenas a interpretar factos. E isso, diga-se, é um trabalho demasiado sério para um blog tão idiota como este. É então tempo de eu puxar das minhas credenciais de idiotice e criar a minha teoria, naturalmente pouco fundamentada e facilmente refutável.
Eu acho, sinceramente, que o inverso dos factos apresentados em epígrafe também se verifica.
Ou seja: nós gostamos de ler sobre coisas com as quais não convivemos. Ou então, de uma forma mais humana, gostamos de ler sobre coisas que não temos e gostávamos de ter um dia.
Pensem comigo:
Só lê revistas sobre destinos turísticos quem nunca lá foi e que gostava de lá ir um dia… Certo?
Só vê revistas de arquitectura de interiores quem tem a casa pelo avesso e gostava de um dia a remodelar… Certo?
Eu diria mais: Só vê o kamasutra quem não costuma conviver muito com pessoas do sexo oposto… Não é?
Eu acredito nisto. Pode ser uma crença idiota, mas isso só vem demonstrar o quanto coerente eu sou.
Só espero que esta teoria falhe em relação aos leitores da Caras. Espero bem que ninguém queira ser como José Castelo Branco ou Lili Caneças…